A importância de se romper as barreiras do idadismo na ótica da Gerontologia

A pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-2 resultou em mudanças intrínsecas e extrínsecas aos indivíduos, impactando o cotidiano e a maneira de viver de toda a população. Ainda nos primeiros meses da pandemia, percebeu-se que a população idosa era predominante entre os casos de hospitalizações e óbitos por coronavírus, tornando a velhice o centro de questões idadistas, carregadas de  preconceitos e estigmas.

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O idadismo (do inglês ageism) refere-se ao preconceito de discriminação etária, em qualquer momento do ciclo de vida. Quando relacionado aos mais velhos, reforça traços como o declínio das capacidades físicas e mentais associados ao processo de envelhecimento. Beauvoir, em sua obra intitulada “A velhice”, mostra que esse tipo de preconceito não é exclusivo da atualidade, pois desde a Grécia Antiga a velhice era utilizada como um  recurso cômico para autores como Aristófanes, que, em seus  textos, ridicularizava a velhice e retratava o velho como “inválido, caduco, semimorto, aquele que suscita risos e não piedade ou horror”.

Esses estereótipos influenciam não apenas a percepção da população geral sobre o envelhecer e a velhice, mas também a autopercepção dos idosos sobre seus papéis na sociedade. Palmore (1999) destaca que as pessoas idosas tendem a adotar imagens subjetivas negativas, que impactam seus relacionamentos interpessoais e culturais.  Sendo assim, o indivíduo torna-se privado de exercer seus direitos em sua integralidade, deslegitimando sua própria história de vida.

Durante a pandemia, declarações públicas reforçando a imagem do idoso frágil, incapacitado e desprovido de qualquer atividade social, política, e não merecedor de assistência adequada, fortaleceram os rótulos de que os idosos seriam, desde o início, o principal  grupo de risco para a infecção por coronavírus e suas consequências. A população idosa foi alvo de debates sobre quem merecia viver ou morrer em um cenário de possível colapso dos sistemas de saúde, e instituições adotaram práticas baseadas na idade cronológica para o uso de tratamento de terapia intensiva, priorizando esse tratamento para indivíduos mais jovens.

Magalhães (2008) cita a importância da promoção de uma imagem positiva do ser idoso, da velhice; da promoção e  utilização do potencial de contribuição dos idosos como membros de uma sociedade, destacando os seus valores, a sua experiência de vida, a sua sabedoria, entre outros; a promoção dos benefícios de uma relação saudável  entre gerações e a promoção do espírito de solidariedade entre gerações. Tais estratégias são imprescindíveis para o combate ao idadismo na sociedade, e, consequentemente, evitariam ou reduziriam situações como as vistas durante a pandemia de Covid-19.

Diga não ao idadismo!


Referências consultadas

1. Magalhães, C. (2008). Estereótipos Acerca das Pessoas Idosas em Estudantes do Ensino Superior, no Distrito de Bragança. Tese de Doutoramento em Gerontologia Social, apresentada à Universidade de Extremadura. Badajoz

2. Palmore, E. B. (1999). Ageism. Negative and Positive (2.ª ed.) New York: Springer Publishing Company, inc.


Texto escrito por:

Andréia Rodrigues Pereira

Estudante de Graduação do curso de bacharelado em Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), foi monitora de iniciação científica no eixo de cultura e extensão em Literatura e envelhecimento 2019-2020; atualmente pesquisadora no projeto de Indicadores de adesão  à vacinação contra a COVID-19 e a correlação com comorbidades em idosos longevos atendidos em um Centro de Saúde Escola da USP, além de integrante do grupo de pesquisa em Intervenções psicoeducativas sobre a COVID-19 aliadas a exercícios cognitivos para a promoção do envelhecimento ativo de profissionais da EACH-USP.

Isabela Martins Oliveira

Bacharel em Gerontologia pela Universidade Federal de São Carlos. Participou de programas de pesquisa e extensão voltadas para o oferecimento de programas de atividade física e atividades de educação em saúde para adultos e idosos atendidos na atenção primária em contexto de alta vulnerabilidade social. Mestre em saúde pública e doutoranda em saúde pública na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo com ênfase na epidemiologia e controle de doenças e agravos não transmissíveis. Vice-diretora científica da Associação Brasileira de Gerontologia (ABG).

Profª Drª Thais Bento Lima da Silva

Docente do curso de Graduação em Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), Coordenadora do curso de pós-graduação em Gerontologia da Faculdade Paulista de Serviço Social (FAPSS), pesquisadora do Grupo de Neurologia Cognitiva e do Comportamento da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e diretora científica da Associação Brasileira de Gerontologia (ABG). Membro da diretoria da Associação Brasileira de Alzheimer- Regional São Paulo. Diretora científica da Associação Brasileira de Gerontologia (ABG). É assessora científica e consultora do Método Supera.

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